2º Aniversário do Blog em Inglês: Por que parei de publicar nesta plataforma?

Categorias: Notícias
Tags: blog
Primeira postagem: 1 janeiro, 2024

Na virada do ano passado, compartilhei os desafios de traduzir meus textos e a satisfação de ver o blog crescendo. Também manifestei meu imenso desejo de escrever e traduzir muitos posts no novo ano que se iniciava.

Entretanto, poucos dias depois, em 8 de janeiro de 2023, deparamo-nos com a estarrecedora cena da tentativa de golpe no Brasil1. Uma multidão de vândalos invadiu os prédios mais importantes de Brasília, nossa capital.

Além do receio de que deixássemos de ser um país democrático, como profissional da área da cultura e dos museus, chocou-me assistir nossos prédios históricos tombados sendo destruídos por uma multidão selvagem e desinformada, para ser eufêmica aqui.

Brasília figura na lista do Patrimônio Cultural da Humanidade da UNESCO. Partiu meu coração assistir à depredação daquelas edificações governamentais, que possuem também museus, coleções de arte, artefatos arqueológicos, mobiliários antigos, livros e documentos históricos.

Diversos espaços e itens conseguiram ser protegidos e salvos da depredação. Outros puderam ser restaurados posteriormente. Entretanto, muitos foram totalmente destruídos para sempre.2

Esses eventos inacreditáveis me motivaram a escrever o último post que publiquei aqui, em janeiro de 2023: Matem os Inteligentes e Habilidosos. Aquele que era para ser apenas o primeiro texto do ano, acabou sendo o único e o último publicado.

Blogar ou não blogar.

Felizmente, nossa democracia resistiu. Mas confesso que tudo isso me deixou bastante apreensiva, refletindo ainda mais sobre alguns temas importantes que povoam há algum tempo as minhas leituras.

Pensei comigo mesma: as pessoas estão agindo de forma ainda mais violenta, temerária, insana e imprevisível do que poderia imaginar.

Costumo fazer o meu planejamento anual em fevereiro, após as férias de verão. Então, depois de tudo que vivemos no último janeiro, decidi que o tempo que teria para dedicar ao blog, que não é tanto como gostaria, seria investido em duas frentes.

A primeira, revisar e atualizar o planejamento de gestão desta plataforma, prevendo várias melhorias estratégicas, técnicas, logísticas e de design, que começarão a ser implementadas aos poucos, agora em 2024. O novo plano prevê, ainda, no longo prazo, a expansão dos recursos do website para além do blog, que é e sempre continuará a ser o foco principal.

A segunda, concluir um texto que estava ensaiando há algum tempo, mas que sempre adiava a redação final, porque o tema é sensível e complexo. Acabei rascunhando várias versões e protelando a escrita por diversos meses em 2022.

Desistir não é uma opção.

E que tema é este, afinal? Narcisismo.

Narcisistas são pessoas que possuem um estilo de personalidade altamente grandioso, egocêntrico, antagônico, utilitarista e deficiente de empatia. Os casos mais graves configuram, ainda, em um transtorno mental, denominado transtorno de personalidade narcisista.

Pessoas narcisísticas cultivam uma visão extremamente inflada de si mesmos. Acreditam veementemente que são superiores aos demais. Gostam de provocar admiração e inveja. E sentem eles mesmos muita inveja, pois se comparam com os outros o tempo inteiro. Não usufruem plenamente de sentimentos como felicidade, paz interior, gratidão e contentamento.

Narcisistas são, ainda, viciados em suprimento narcisístico, que é a validação externa, a necessidade de se sentir especial e de receber atenção com emoção. E pode ser emoção positiva ou negativa. O que eles não suportam é a indiferença dos demais.

O fato é que narcisistas possuem uma visão extremamente transacional dos seus relacionamentos. Para suprirem o vício em atenção, eles manipulam, vitimizam-se e/ou brincam com os sentimentos dos outros. Tratam as pessoas como se fossem objetos, sem o menor pudor ou remorso. E os problemas decorrentes desse tipo de comportamento tóxico são inúmeros.

Nada disso é novidade, narcisismo sempre existiu. Tanto que Narciso é um personagem da mitologia grega. Contudo, em tempos de Internet, o alcance dos narcisistas deixou de ser a escola, a universidade, a igreja, o bairro, a empresa ou até o país que ele ou ela preside. Passou a ser o mundo todo.

E o Olimpo, o playground, o tabuleiro desses jogos mentais narcisísticos são, claro, as redes sociais.

Este é um dos muitos bons motivos pelos quais hoje inicio um novo projeto de produtividade pessoal: Um ano de Detox Digital. Neste projeto, pretendo monitorar o meu consumo de conteúdo digital e reduzi-lo ao máximo, dando mais espaço e tempo livre para relacionamentos presenciais saudáveis, ócio criativo e leitura de livros.

Redes sociais prejudicam seriamente sua saúde mental.

Hoje entendo que saber mais sobre narcisismo é crucial para vencermos os problemas que vivenciamos na contemporaneidade, tais como a invasão em 8 de janeiro, guerras (que sequer seguem princípios elementares de civilidade e direitos humanos), desigualdade social, anti-intelectualismo, fake news e desinformação, cultura do publish or perish nas universidades, devastação da Amazônia, aquecimento global e por aí vai.

Dos pequenos aos grandes, a raiz de muitos desses males é, em boa medida, o narcisismo. Afinal de contas, narcisistas são indivíduos altamente obcecados com status, controle e poder. Portanto, estão super-representados em posições de liderança e influência. Principalmente quando também possuem traços de psicopatia.

E o impacto disso é gigantesco nos processos de gestão, mercado da produtividade, fenômenos sociais, leis, arte, intelectualidade, economia, ciência, filosofia, religião etc.

Do nosso trabalho ao nosso gosto, tudo isso está sendo, cada dia mais, influenciado por uma cultura narcisística. Enfim, todas as coisas que delineiam o zeitgeist, que regem a sociedade e acabam por definir o nosso cotidiano.

Daí a minha urgência em priorizar esse tema num post, que foi finalmente concluído em 2023. No momento, a primeira versão está sendo lida pelos meus conselheiros, que sempre me dão seu feedback e sugestões de melhorias. Estou feliz com o resultado, espero que gostem também.

Levou mais tempo do que imaginei para escrevê-lo, porque tomou muito tempo de reflexão e pesquisa. Nos últimos dois anos, li mais de vinte livros sobre narcisismo, psicopatia e saúde mental. Sem mencionar as conversas com profissionais da saúde e centenas de vídeos, documentários, entrevistas etc. que assisti. Entendo que essa demora e preparação foram indispensáveis, pois é um assunto complicado e espinhoso.

Sem risco, sem história.

Será o post mais longo do blog, provavelmente o maior que ele terá em toda a sua história. É praticamente um livro, mas sei que minhas queridas leitoras e leitores não têm medo de textos extensos.

De fato, mesmo sem postar quase nada, no último ano o blog bateu o seu recorde de acessos mensais. Muitos visitantes chegaram aqui não só através dos mecanismos de busca, mas também clicando direto nos links compartilhados por alguém. E, ainda, disponibilizados em plataformas de gestão ou ambientes virtuais didáticos, como Moodle.

Alguns textos traduzidos para o inglês passaram a figurar entre os dez mais acessados da plataforma como um todo, levando este conteúdo para mais de cem países. Atualmente, mais da metade do tráfego deste site vem do exterior, principalmente dos EUA, Reino Unido, Alemanha e outros países da Europa.

É o poder da Web já mencionado aqui. E que pode ser usado para propagar valores narcisísticos, mas também para combatê-los. Esses dois anos que hoje a plataforma comemora são apenas o começo. Eu adoro este projeto e ele hoje faz parte da minha missão pessoal e profissional.3

E ter vocês aqui comigo me dá a certeza de que não estou só na minha busca diária por uma produtividade que priorize qualidade de vida e bem-estar social.

Obrigada pela presença, pelas leituras críticas, pelos compartilhamentos, pelos e-mails inteligentes que chegam do Brasil e de outros continentes. Sinto-me muitíssimo bem acompanhada. Vamos juntos, sempre remando nestas imensas ondas do nosso ciberespaço.

Encerro aqui este breve post, que é mais para dar notícias depois do meu sumiço. Está tudo ótimo comigo, espero que com você também esteja.

Que esta página em branco que ganhamos de presente hoje seja preenchida com ainda mais alegrias e sonhos concretizados em 2024. Feliz ano novo para você que me lê!

Vire a página.

Notas

1 – Invasão de Brasília em 08 de janeiro de 2023

Este documentário da BBC News resume bem o que aconteceu nesta tentativa de golpe: a depredação dos edifícios, o papel das redes sociais na disseminação da desinformação, dentre outros tópicos relevantes para compreender o contexto daquele fatídico dia.

Documentário 8 de Janeiro: O dia que abalou o Brasil – BBC News Brasil

2 – A importância do patrimônio cultural edificado e dos museus de Brasília, atacados em 08 de janeiro de 2023

Este artigo, publicado no website do ICOM – International Council of Museus, resume a importância do patrimônio cultural e museal que foi vandalizado.

The Collections and the Coup: How Brazilian democratic institutions safeguarded their historical and artistic heritage following an attempted coup

3 – Este blog como missão pessoal e profissional

Em termos pessoais, este blog é o meu legado de ideias para nossos filhos. É tudo que gostaria de compartilhar com eles no futuro sobre valores e produtividade, caso não esteja aqui para fazê-lo. E é uma alegria ter milhares de leitores, pois assim meus textos podem alcançar mais pessoas para além destes dois pequeninos.

Em termos acadêmicos, é uma oportunidade de compartilhar sobre as nossas pesquisas e a cultura brasileira. O tipo de pesquisa que faço, envolvendo gestão e inclusão, possuem resultados aplicados, ou seja, voltados para a prática profissional nas bibliotecas, arquivos e museus.

Deste modo, o blog alcança mais o meu público-alvo nacional e internacional do que algumas das minhas publicações científicas e capítulos de livro. E o retorno é visível, não apenas no número de acessos diretos que os textos têm, mas também nos contatos e oportunidades que recebo via e-mail. O blog cumpre, portanto, um papel importante na divulgação científica do nosso trabalho na universidade.

Por todos estes motivos, este blog é parte da minha missão de vida pessoal e profissional.

Agradecimentos: Alberto Nogueira Veiga e todos os que me deram seu precioso feedback, obrigada pelos comentários e sugestões.

Imagens: Fotografias do Pexels de Karolina Grabowska e Suzy Hazelwood. Imagens trabalhadas com elementos gráficos do Canva.

Foto de Ana sorrindo. Ana é uma mulher branca de meia-idade, com grandes olhos castanhos e cabelos ondulados com mechas louras, na altura dos ombros.

Ana Cecília é professora na UFMG, Brasil. Pesquisa gestão inclusiva e tecnologias da informação e comunicação para museus, bibliotecas e arquivos. Mora em Belo Horizonte com o esposo Alberto e seus dois filhos. Ama ler, desenhar, caminhar e viajar.

 

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